terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

8Dias



Uma questão de moral. Será?


Nova polémica emerge da acção do Ministério da Educação. Desta vez envolve uma campanha sobre violência nas escolas. Para ser preciso, a campanha centra-se no bullying, mas centra-se na sua expressão homofóbica. Julgo que a palavra adequada para referir este tipo de problemas seja apenas: violência (1).

A campanha parece estar suspensa, ao que parece, porque o Ministério da Educação considera que as campanhas que patrocina não devem favorecer visões ideológicas sobre a Sociedade. Mas considere-se a mensagem e a imagem que consta desses cartazes (2) . Será que a campanha é muito diferente de outras que o Ministério da Educação já promove? Como a visão supostamente não-moralista que têm as suas linhas orientadoras para a Educação Sexual ou o tratamento das problemáticas religiosas na Escola Pública. Será que a recusa do Ministério se sustenta, na comparação com estas, que já se encontram decididas e, algumas delas, implementadas?

Dirijo agora a nossa atenção para o que me parece mais importante. Mesmo na perspectiva da salvaguarda dos direitos daqueles que visa defender (homossexuais, por exemplo), esta campanha não seria mais um foco de discriminação? Não seria mais uma forma de tratar diferentemente quem, na sua vida social e pública, é igual? Não será a Escola o lugar da formação dos cidadãos que se espera possam conciliar as suas convicções e crenças pessoais e o respeito pelas convicções e crenças dos outros? Independentemente de um cidadão pertencer a uma minoria ou a uma maioria.

Para o caso em análise, consideram os leitores que se faz um trabalho justo tratando diferentemente quem, quanto à sua orientação sexual ou à sua opção política, é supostamente igual?

professor Luís Vilela

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(1)Talvez se desconheça que, na sua origem circa séc. XVI, a palavra boele ´lover` que mais tarde evolui para bullying, designava uma afeição e carinho que se dedicava a alguém.


(2)Vejam-se os cartazes em:
http://www.rea.pt/inclusao/materiais/cartazA1.jpg
http://www.rea.pt/inclusao/materiais/cartazB2.jpg

8 comentários:

  1. Se é um trabalho justo? Tão justo como escrever um texto de convite à reflexão sobre o assunto ou um comentário ao mesmo texto, como eu, neste momento, estou a fazer.
    Talvez o longo e sinuoso percurso para a aceitação plena da diversidade de características individuais (nem diferentes nem iguais a nada – apenas características) passe por cartazes, textos, comentários e olhares…

    Luta-se pela aceitação, integração e inclusão de “diferenças” ou “minorias”, quando esta perspectiva matemática de quantidades a três dimensões parece servir mecanismos de controlo, hábeis instrumentos de manipulação em série que ofuscam a liberdade natural da unicidade singular de cada indivíduo. Aparentemente, estamos, pois, perante uma compatibilidade morta à nascença.
    Por outro lado, não faria sentido os slogans dos referidos cartazes serem: “Ele gosta de fruta e estamos bem com isso” e “O bullying fructofóbico não é aceitável na nossa escola”. O gostar de fruta ainda não constitui perigo de espécie alguma para a sociedade, não é agressivo, não choca, não causa insegurança, não divide… Pelo menos, ainda não à mesma escala. Também as orientações sexuais, opções políticas ou outras não o deveriam fazer. No entanto, parecem incomodar ou cativar a atenção (o “diferente” é e sempre será sedutor, pela positiva ou negativa), movimentar medos ou tentações. Isto reslava na ideia de que o indivíduo é, desde criança, orientado por padrões, normas, fantasias de “normalidades” e das “maiorias”, conceitos de perfeição, limites que mais tarde se compreende que estão muito aquém do potencial infinito da(s) realidade(s). É ensinado a apontar o dedo e a desprezar o que sair dessas referências (apenas o que constituir ameaça – a fruta, por exemplo, ainda não se inclui nesta categoria) e, mais tarde, a aceitar as variações, a recuperar o vínculo afectivo desde sempre quebrado. É um movimento épico que embate na dimensão simbólica e abstracta que pauta as sociedades. É quase um acto de traição para com esses ensinamentos “cristalizados” do exterior e um acto de lealdade individual. E, evidentemente, o Ministério da Educação sabe disto e talvez por isso se queira impunemente abster da incoerência de não moralizar, ainda que “moralizando”.
    Para essa transgressão iniciática, porém, é preciso ter a coragem de aceitar que a imagem que se reflecte num espelho é apenas uma das possíveis representações simetricamente opostas à do objecto reflectido, que a vivência dos sonhos pode ser tão intensa ou real como a do quotidiano, que a existência dessas dualidades ou pluralidades, entre outras, é um facto; apenas se pode alterar o foco, o destaque e o valor que se quiser oferecer…oferecer… e, contudo, luta-se por receber, tenta-se a aceitação… Violento? Sem dúvida. Uma questão de moral. E o que é a moral?...

    Elisabete Dourado


    P.S.: Luís, parabéns pelos textos e por esta iniciativa! Muito interessante.

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  2. A felicitação é, obviamente, extensível ao Alexandre e a toda a equipa responsável por este espaço.

    Elisabete Dourado

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  3. A defesa de direitos deve ser um movimento na direcção dos mais desprotegidos e ameaçados.

    Julgo que este caso se aplica a um grupo de pessoas sujeitas à discriminação, por parte da generalidade da sociedade.

    Portanto, deve-se cuidar-se especialmente do seu problema. Tratando-os de um modo diferente dos outros, mas com a intenção de os proteger e não de maltratar ou de humilhar.

    Naturalmente, que esta preocupação apenas se justificará enquanto se julgar que estão numa posição mais fragilizada no contexto social.

    Como podemos avaliar esse estado de fraqueza ou de normalidade?

    Teremos que cada um nós assumir, com firme convicção, a responsabilidade do nossa avaliação da situação analisada. (sim, claro que é uma questão moral...)

    Assim, julgo que esta pode vir a ser uma campanha interessante e positiva.

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  4. Depois de ler estas reflexões ocorre-me uma frase que muito prezo e com a ajuda da qual tanto tenho aprendido:

    "Não há normas. Todos os homens são excepção a uma regra que não existe."

    Fernando Pessoa

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  5. Saudações a Todos,
    Os comentários que recebemos exigem uma leitura atenta e cuidada. Para proceder à sua síntese. Assim, temos:
    - no primeiro comentário, a posição que parece evidenciar-se é a de que estas relações de identidade-diferença são fortemente marcadas pelos legados culturais em que nos inserimos; sendo a convivência tolerante uma exigência ética de cada um, na aprendizagem que faz das diferenças que pautam a nossa vida colectiva, apesar das suas limitações e das suas contradições; em conclusão, o esforço da aceitação é pessoal e faz parte do enriquecimento moral de cada um.
    - quanto ao segundo comentário, há uma diferença substancial e ela está ancorada na ideia de que, quem está numa posição socialmente mais fragilizada, deve ser tratado diferentemente; esta posição parece assumir que a relação identidade-diferença deve estar caucionada por regras de discriminação positiva definidas por uma autoridade ou um directório.
    - quanto às palavras do Poeta, resta-me dizer apenas que capturam aquilo mesmo que é a essência do problema e, na sua inteligência, deixam-nos face à perplexidade de saber que não sabemos.

    Deixo mais umas perguntas:
    - Mas a moral exige um código positivo (de um directório ou autoridade pública)?
    - O reconhecimento da posição do Outro e do diferente, a nossa relação com ele, não é o pressuposto e a exigência que abre o espaço da acção moral?
    - Será que, para além das nossas diferenças, não há uma esfera inviolável (a Pessoa) que nos iguala na dignidade?

    Saúdo os nosso leitores, celebrando a participação que fazem deste nosso espaço. Muito o honram.
    Bem hajam,
    Luís Vilela.

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  6. Aluno Bissexual da ESLC6 de março de 2011 às 19:45

    Mais um aspecto em que o Ministério deveria dar mais valor.
    Todos nós sabemos, e deixemo-nos de falsos moralismos, que a homofobia (ou discriminação sexual) existe, tanto na sociedade em geral como na Escola, em particular, e a Leal da Câmara não é excepção. A maioria dos alunos homossexuais e bissexuais existentes na Leal são obrigados a (con)viver diariamente como heterossexuais uma vez que se verifica, em larga escala, a discriminação por parte dos alunos ditos Heteros perante os outros. São factos lastimáveis que acontecem na Leal bem como em muitas outras escolas do nosso país.

    "Não será a Escola o lugar da formação dos cidadãos que se espera possam conciliar as suas convicções e crenças pessoais e o respeito pelas convicções e crenças dos outros?" - Deveria ser esse local, se existissem condições para tal e as escolas portuguesas ainda não se capacitaram que têm que tornar este assunto um assunto de debate. A introdução da disciplina de Educação Sexual serviria para ajudar a combater estes ataques discriminatórios bem como esclarecer os jovens sobre factos importantes sobre a homossexualidade (pasme-se: ainda existem jovem, CASO REAL, que pensam que a homossexualidade se "pega" pela troca de um simples aperto de mão e que o HIV/Sida só existe nos homossexuais. Dados reais mostram que actualmente, e para o desconhecimento da maioria, a população mais infectada pelo HIV/Sida é heterossexual).
    Debates / Palestras sobre a homossexualidade ajudariam, também e em muito, a combater o mesmo problema. A Rede Ex-Aequo (REA) é uma mais valia no apoio a jovens LGBT's (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) e é, também, a REA que tem imenso material e apoio na realização das ditas palestras / debates. Porquê continuar a esconder o que é cada vez mais óbvio aos olhos da sociedade? Porquê continuar a não aceitas as diferenças quando somos todos diferentes (em múltiplos aspectos)? Porquê continuar a ser a mente fechada e pequenina que não aceita o Mundo real e continua a viver na imaginação?
    Esta campanha não seria, de todo, mais um foco de discriminação, pelo contrário, iria fazer abrir mentes e ver que afinal, mesmo diferentes, somos iguais e convivemos com homossexuais e bissexuais todos os dias, sem sabermos.
    Há que encarar esse assunto com a naturalidade que ele pede, leva-lo a debates e fazer os alunos abrir as mentes. Muitos de nós queremos sair do armário, e só não o fazemos por as mentes serem demasiado fechadas.
    Vamos abrir mentes. Vamos lutar contra as diferenças e tornar-nos iguais (uma vez que com a discriminação deixamos de o ser). Vamos ser iguais com as nossas diferenças!

    "Todos diferentes mas todos iguais!"



    PS: Sugiro aos professores orientadores de Biblioteca (nomeadamente a Professora Liliana Silva), ao professor Jorge da direcção e a mais uns quantos professores (Regina Leitão, por exemplo) que organizem palestras/debates sobre este assunto com algumas turmas da escola!

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  7. Saudações,
    Aos nossos leitores, em particular ao aluno que assina “Aluno bissexual da ESLC”. Agradecer o seu comentário e sublinhar – de modo consciente e responsável – que são estas intervenções e comentários que podem fazer mudar a situação discriminatória a que o artigo originalmente faz referência. No entanto, o que interessa pensar é se não são estas intervenções, estes testemunhos pessoais, justamente, que têm impacto e promovem mudanças na comunidade escolar. Na escola e na sociedade, obviamente*.
    Não serão esses comportamentos que acabam por mostrar que a diferença não impõe constrangimentos à dignidade de cada indivíduo? Ninguém (nem o Estado, nem a Sociedade ou a Direcção de uma Escola) pode pôr em causa a liberdade e a dignidade individual. Logo, será coerente pedir a uma instituição/entidade que assuma a defesa dessa liberdade e dessa dignidade?
    O que importa ponderar é: não será o assumir – responsável e sereno – da identidade pessoal (e da sua construção) a melhor garantia do respeito por essa liberdade e essa dignidade?
    A resposta que dermos a esta questão – no nosso comportamento diário - vai demonstrar até que ponto assumimos e respeitamos a diversidade que enriquece a sociedade em que vivemos. Portanto, se respeitamos a liberdade e a dignidade do outro em definir-se. Em ser quem é.
    Afinal, para isso necessitamos de campanhas publicitárias? Não bastam os procedimentos e as regras instituídas na Escola para punir um acto discriminatório ou violento?

    Continuemos a pensar e a discutir, portanto.
    o Prof. Luís Vilela.

    * Em particular quando as intervenções são assinadas e assumem, sem vergonha, sem condescendência a liberdade individual.

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  8. Devido ao ritmo alucinante que foi o 2ºperíodo, não deu para comentar este post.
    Erradamente, muitos bissexuais e homossexuais encaram tudo o que é dito e feito como homofóbico!
    Nem tudo é, de facto, homofóbico! Vejamos este exemplo:
    Se um aluno chamar "paneleiro" a outro, isso é considerado descriminação?
    Depende. Pela parte da intenção sim, é. Mas, se analisarmos bem, a palavra nem sequer existe! (eu não a encontrei no dicionário...)
    É uma palavra insultuosa mas se e só se lhe dermos alguma relevância.
    Contudo, nem só os ditos heterossexuais são homofóbicos. Pessoas desta espécie "minoritária" também descriminam outras pessoas do mesmo tipo! Tudo isto para quê? Para que os restantes hetero não saibam da sua verdadeira sexualidade de modo a não serem gozados ou mal falados!
    A culpa nem sequer é dos tais heterossexuais que gozam e que falam mal e que fazem "30 por 1 linha". A culpa é, sem dúvida alguma, destas pessoas que vivem sob uma máscara, sob um disfarce assumindo a cobardadia e a mediocridade do que são!
    Afinal, para quê ter vergonha do verdadeiro "eu"? Porquê usar uma máscara que depois, mais tarde ou mais cedo cai?
    Tenho muito orgulho em ser o que sou e, de forma livre, assino com o meu nome: Filipe.

    P.S.: Talvez possa ter fugido um pouco ao tema porém, ao ver o comentário do "Aluno bissexual da Leal" fez-me, de certa forma, fugir um pouco.

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