Quando me contou que tinha feito uns bonitos arranjos para oferecer e descreveu, cheia de entusiamo, o que já tinha encontrado para novas experiências, senti-a de volta. Senti-lhe a alegria, nos ocres e nas cores vivas dos pigmentos, em cada textura que descrevia. Regressava pelo cheiro imaginado das especiarias, que foi desfiando na conversa como se de pérolas se tratasse. A cada frase, a canela, a pimenta-de-caiena e a da Jamaica, o açafrão, o cardamomo e o anis-estrelado iam-se transformando em belos ornamentos.
Vibrante e criativa, sempre à procura de sentido, tinha uma energia e uma capacidade extraordinárias para nos contagiar.
Lembras-te quando vim de Goa carregada de especiarias, armada em aprendiz de feiticeiro?
Tudo lhe servia para fazer a diferença, fruto de um bom gosto em que se movia como ninguém.
Lembra-se, D. Irene, como todos nos deslumbrávamos?
Mais uma vez, acreditei.
Tenho de te levar a nova caneta que comprei. Uma bela caneta de aparo, das que tanto gostas de usar para escreveres os teus dizeres.
Tenho de te levar a nova caneta que comprei. Uma bela caneta de aparo, das que tanto gostas de usar para escreveres os teus dizeres.
Muitos saberemos ainda de memória algumas das palavras que nos ofereceu, naquela caligrafia inconfundível. Era perita em tornar especiais todas as ocasiões. Em nos fazer sentir únicos.
Já num dos dias de luto, a Rosa Borges partilhou comigo esta última memória:
“No dia 25 de abril a Eugénia telefonou para a Dínamo. Não poderia estar presente mas queria dizer a surpresa que nos tinha preparado: 24 cravos de cores diferentes com uma mensagem: É por causa de abril que podes escolher aquele de que mais gostas.”
Esta é a Eugénia que agora escolho relembrar. Como diz a Rosa, esta é a Eugénia que nos ensinou “a força, a ternura dos gestos cuidadosos e amorosos, a alegria de viver”. A que amou e ensinou a amar a Liberdade.
Foi uma mulher de convicções. Sempre fez questão de não abdicar do sonho.
Como professora, trabalhou com empenho e dedicação. Entusiasmava os alunos. Incentivava-os a ir rio acima, sempre adiante. Convictamente, acreditava que todos seriam capazes. Muitos dos que foram seus alunos ainda hoje lhe agradecerão por se ter envolvido sem tréguas nem condescendência.
Educar foi, desde sempre, a sua primeira vocação: deixou-nos um filho que é prova maior dessa missão.
Com os colegas, aprendeu e partilhou o seu saber com alegria, acreditando que juntos valeríamos mais. Cultivou o gosto pelo outro e respeitou a diferença. Amou o que é vário.
Andarilha e irrequieta, trazia o mundo consigo.
Assim recordaremos Maria Eugénia. Assim lhe prestamos homenagem.
Com cravos de todas as cores.
Tuta Brás dos Santos
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